quinta-feira, 21 de abril de 2011

ARACELI: SÍMBOLO DA LUTA CONTRA A VIOLÊNCIA

por Pedro Argemiro

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Durante mais de três anos, na década de 70, pouca gente ousou abrir a gaveta do Instituto Médico-Legal de Vitória, no Espírito Santo, onde se encontrava o corpo de uma menina de nove anos incompletos. E havia motivos para isso. Além de o corpo estar barbaramente seviciado e desfigurado com ácido, se interessar pelo caso significava comprar briga com as mais poderosas famílias do estado, cujos filhos estavam sendo acusados do hediondo crime. Pelo menos duas pessoas já tinham morrido em circunstâncias misteriosas por se envolverem com o assunto.

Ainda assim, corajosos enfrentavam os poderosos exigindo justiça, tanto que o corpo permanecia insepulto na fria gaveta, como se fosse a última trincheira da resistência. O nome da menina era Araceli Cabrera Crespo e seu martírio significou tanto que o dia 18 de maio – data em que ela desapareceu da escola onde estudava para nunca mais ser vista com vida – se transformou no Dia Nacional de Combate ao Abuso e Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes.

Por uma dessas cruéis ironias, Jardim dos Anjos era onde ficava um casarão, na Praia de Canto, usado por um grupo de viciados de Vitória (ES) para promover orgias regadas a LSD, cocaína e álcool, nas quais muitas vítimas eram crianças – anjos do sexo feminino. Entre a turma de toxicômanos, era conhecida a atração que Paulo Constanteen Helal, o Paulinho, e Dante de Brito Michelini, o Dantinho, líderes do grupo, sentiam por menininhas. Dizia-se, sempre a boca pequena, que eles drogavam e violentavam meninas e adolescentes no casarão e em apartamentos mantidos exclusivamente para festas de embalo. O comércio de drogas era, e é muito enraizado naquela cidade. O Bar Franciscano, da família Michelini, era apontado como um ponto conhecido de tráfico e consumo livres.

Suspeitas sobre a mãe da menina

Araceli vivia com o pai Gabriel Sanches Crespo, eletricista do Porto de Vitória, amãe Lola, boliviana radicada no país, e o irmão Carlinhos, alguns anos mais velho que ela. Na casa modesta, localizada na Rua São Paulo, bairro de Fátima, era mantido o viralata Radar, xodó da menina, que o criava desde pequenino. Segundo o escritor José Louzeiro que acompanhou o caso de perto e o transformou no livro “Araceli, Meu Amor” – o nome Radar foi escolhido pela garota “para que o animal sempre a encontrasse”. Araceli estudava perto de casa, no Colégio São Pedro, na Praia do Suá, e mantinha urna rotina dificilmente quebrada. Ela saía da escola, no fim da tarde, e ia para um ponto de ônibus ali perto, quase na porta de um bar, onde invariavelmente brincava com um gato que vivia por ali.

No dia 18 de maio de 1973, uma sexta-feira, a rotina de Araceli foi alterada. Ela não apareceu em casa e o pai, num velho Fusca, saiu a procurá-la pelas casas de amigos e conhecidos, até chegar ao centro de Vitória. Nada. A menina não estava em lugar algum. Só restou a Gabriel comunicar a Lola que a filha estava desaparecida e que tinha deixado seu retrato em redações de jornais, na esperança de que fosse, realmente, somente um desaparecimento. No dia seguinte, quando foi ao colégio para conseguir mais informações, Gabriel ficou sabendo que a menina tinha saído mais cedo da escola. De acordo com a professora Marlene Stefanon, Araceli tinha “ido embora para casa por volta das quatro e meia da tarde, como a mãe mandou pedir num bilhete”.

Na véspera, Lola tivera uma reação aparentemente normal ao constatar a demora da filha em chegar em casa. Primeiro, ficou enervada; depois, preocupada. No sábado, tarde da noite, sofreu uma crise nervosa e precisou ser internada no Pronto Socorro da Santa Casa de Misericórdia. Ainda no início do processo, acabariam pesando sobre ela fortes suspeitas e graves acusações. Lola foi apontada como viciada e traficante de cocaína, fornecedora da droga para pessoas influentes da cidade e até amante de Jorge Michelini, tio de Dantinho. E mais: ela era irmã de traficantes de Santa Cruz de La Sierra, para onde se mudou tão logo o caso ganhou dimensão, deixando para trás o marido Gabriel e o outro filho, Carlinhos. Não se sabe até onde Lola facilitou ou estimulou a cobiça dos assassinos em relação a Araceli.

Menina era usada no tráfico de drogas

A respeito de Dantinho e de Paulinho Helal, dizia-se que uma de suas diversões durante o dia era rondar os colégios da cidade em busca de possíveis vítimas, apostando na impunidade que o dinheiro dos pais podia comprar.Dante Barros Michelini era rico exportador de café (tão ligado a Dantinho que chegou a ser preso, acusado de tumultuar o inquérito para livrar o filho).Constanteen Helal, pai de Paulinho, era comerciante riquíssimo e poderoso membro da maçonaria capixaba. Seus negócios também incluíam imóveis, hotéis, fazendas e casas comerciais. Já o eletricista Gabriel, seu maior tesouro era a filha. No domingo, ele foi à delegacia dar queixa, onde lhe foi dito que tudo seria feito para encontrar Araceli. Na Santa Casa, ele contou a Lola o resultado de sua busca e falou da garantia dos policiais de que tudo acabaria bem. Lola pareceu não acreditar – e chorou. O escritor José Louzeiro não tem dúvida:

Lola foi, indiretamente, a causadora do hediondo crime de que sua filha foi vítima. “Na sexta-feira, a mando da mãe, Araceli tinha ido levar um envelope no edifício Apoio, no Centro de Vitória, ainda em construção, mas que já tinha uns três ou quatro apartamentos prontos, no 8º andar. A menina não sabia, mas o envelope continha drogas. Num dos apartamentos, Paulinho Helal, Dantinho e outros se drogavam. Ela chegou, foi agarrada e não saiu mais com vida”, conta o escritor.

O que aconteceu realmente com Araceli Cabrera Crespo talvez nunca se saiba. E talvez, seja bom mesmo não conhecer os detalhes, tamanha é a brutalidade que o exame de corpo delito deixa entrever. A menina foi estupidamente martirizada. Araceli foi espancada, estuprada, drogada e morta numa orgia de drogas e sexo. Sua vagina, seu peito e sua barriga tinham marcas de dentes. Seu queixo foi deslocado com um golpe. Finalmente, seu corpo – o rosto, principalmente – foi desfigurado com ácido.

Corrupção e cumplicidade da polícia

Seis dias depois do massacre da menina, um moleque caçava passarinhos num terreno baldio atrás do Hospital Infantil Menino Jesus, na Praia Comprida, perto do Centro da capital. Mas o que ele encontrou foi o corpo despido e desfigurado de Araceli. Começou, então, a ser tecida uma rede de cumplicidade e corrupção, que envolveu a polícia e o judiciário e impediu a apuração do crime e o julgamento dos acusados por uma sociedade silenciada pelo medo e oprimida pelo abuso de poder.

Dois meses após o aparecimento do corpo, num dia qualquer de julho de 1973, o superintendente de Polícia Civil do Espírito Santo, Gilberto Barros Faria, fez uma revelação bombástica. Ele afirmou que já sabia o nome dos criminosos, vários, e que a população de Vitória ficaria estarrecida quando fossem anunciados, no dia seguinte. Barros havia retirado cabelos de um pente usado por Araceli e do corpo encontrado e levado para exames em Brasília. confirmando que eram iguais. Por que a providência? Até então, havia dúvidas que era de Araceli o corpo que apareceu desfigurado no terreno baldio. Gabriel sabia que era o da filha – ele o reconheceu por um sinal de nascença, num dos dedos dos pés. Mas Lola disse o contrário. Assim que se recuperou, ela foi ao IML reconhecer o corpo e afirmou que não era de sua filha. Louzeiro recorda um outro fato a respeito disso, altamente elucidativo. Certo dia, Gabriel levou o cachorro Radar ao IML só para confirmar, ainda mais sua certeza. Não deu outra: mesmo com a gaveta fechada, animal agiu realmente como um radar, como Araceli premonizara, e foi direto à geladeira onde estava o corpo de sua dona.

O delegado muda de opinião

Porém, sem que explicasse o porquê (na noite anterior, ele tivera um encontro com Dante Michelini), Barros Faria mudou de opinião e, ao invés de estarrecer a população de Vitória, provocou riso e deboche por uma lado, e revolta, por outro. O assassino de Araceli, segundo ele, era um velho negro, demente, que perambulava pela Praia do Suá, perto da escola da menina. Começava a escalada de suborno, ou de medo. Coisa que não fazia parte do caráter de um sargento da Polícia Militar, lotado no serviço secreto, e de um vereador do MDB de Vitória. O primeiro, Homero Dias, acabaria pagando com a vida as investigações que fez. Certo de que estava mexendo em casa de marimbondos, o sargento Homero procurava se cercar de muito cuidado durante suas investigações. Tudo que apurava, ele comunicava a seu superior imediato, ocapitão Manoel Araújo, também delegado de polícia, em quem confiava. A esposa, Elza, e ao sogro, João Dias, confidenciou certa vez: “Já tenho material para incriminar muita gente. Acho que o capitão Araújo já pode interrogar o filho de Constanteen Helal.”

Repentinamente, Homero foi afastado do caso pelo próprio capitão Araújo e recebeu ordens de perseguir o traficante José Paulo Barbosa. o Paulinho Boca Negra, na ilha do Príncipe. Na operação, Homero foi atingido nas costas e morreu. O próprio Boca Negra diria depois, na Penitenciária de Vitória, até ser calado para sempre, tempos após, com 27 facadas:

“Quem matou o sargento Homero foi o soldado da PM que estava com ele. Eu vi quando ele atirou.”

Evidências apontam para Helal e Dantinho

O vereador era Clério Vieira Falcão, falecido há cerca de seis anos, que travou incansável luta para botar na cadeia os assassinos de Araceli. Ele deflagrou uma campanha, que repercutiu em todo o país, exigindo a apuração do crime e a apuração dos culpados, que apontava: Dante de Brito Michelini, Paulo Constanteen Helal e a amante deste, Marisley Fernandes Muniz, viciada em drogas. O nome dela surgiu no caso graças à paciente investigação feita pelo perito Asdrúbal de Lima Cabral, o Dudu, que, com a ajuda de seu colega carioca Carlos Éboli, também muito contribuiu para que o caso não fosse esquecido. Louzeiro recorda, por exemplo, que certa ocasião Dudu seguiu a mãe de Araceli, Lola, até São Paulo. Ela tinha saído de Vitória vestida praticamente como uma mendiga e, num hotel da capital paulista, vestira roupas elegantes e embarcara num avião para a Bolívia. Motivo: comprar drogas para a gangue dos acusados, mesmo após a morte da filha.

Eleito deputado, Clério Falcão conseguiu formar uma CPI para apurar o caso, que obteve mais resultados que a própria polícia. Ouvida na CPI, Marisley Fernandes declarou que o casarão do Jardim dos Anjos era reduto de festas de filhos de milionários, onde se consumia grandes quantidades de cocaína e LSD.

Ela também disse, mas depois negou, que Paulinho Helal a tinha levado ao local onde estava o corpo de Araceli, num carro onde havia um frasco com um líquido amarelo e luvas. O objetivo dele, segundo a amante, era ver se precisavadespejar mais ácido no cadáver para dificultar o reconhecimento. Também convocado a depor na CPI, o perito Carlos Éboli disse que os assassinos deram uma dose excessiva de LSD a Araceli.

O Caso Araceli também fez vítimas do lado dos acusados. Uma delas foi o jovemFortunato Piccin, um viciado que perdia completamente a razão quando se drogava em excesso. Ele foi apontado pelo capitão Manoel Araújo como suspeito do crime e morreu depois de tomar um remédio trocado, na Santa Casa de Misericórdia de Vitória, da qual Constanteen Helal era provedor. Também há suspeitas de que o próprio Jorge Michelini, tio de Dantinho, tenha sido eliminado por ameaçar contar tudo que sabia. Numa madrugada, o carro que dirigia foi atingido pelo ônibus de uma empresa, cujos veículos só circulavam até meia-noite. Segundo Louzeiro, outros dois assassinados foram um mecânico que prestava serviços para Paulinho Helal e o porteiro do Edifício Apolo.

O corpo de Araceli, segundo as investigações, teria sido levado num Karmann-Ghia do Edifício Apolo para o Bar Franciscano, onde ficou dentro de uma geladeira. Posteriormente, o corpo teria sido conduzido à Santa Casa de Misericórdia, com a cumplicidade do funcionário do serviço de necrópsia Arnaldo Neres, que viraria depois dono de funerária. Finalmente, o cadáver da menina foi deixado no terreno baldio. Muita gente viu e soube do que estava acontecendo durante aqueles dias. Os carrascos de Araceli fizeram tudo quase abertamente, tal a certeza da impunidade. O inquérito policial não passou de uma farsa e o longo processo judicial não conseguiu transformar evidências em provas.

Ainda assim, em agosto de 1977, o juiz Hilton Sily (falecido em abril passado), determinou a prisão de Dante de Brito Michelini e Paulo Constanteen Helal, pelo assassinato de Araceli, e de Dante Barros Michelini, acusado de tumultuar o inquérito para livrar o filho. Em outubro do mesmo ano eles já estavam soltose o juiz havia sido “promovido” a desembargador. Em 1980, Dantinho e Paulinho foram julgados e condenados, mas a sentença foi anulada. Em novo julgamento, realizado em 1991, os reús foram absolvidos.

O crime já prescreveu. Mas o Caso Araceli é uma ferida que nunca cicatrizou completamente. Mexer com o assunto em Vitória ainda desperta medo, revolta e incredulidade.

terça-feira, 19 de abril de 2011

Leituras Recomendadas para o Vestibular 2012 da UFPA

1. O lirismo amoroso nas cantigas trovadorescas.

2. Gil Vicente — O pranto de Maria Parda (monólogo).

3. Amor e desconcerto do mundo nos sonetos de Camões

4. Lirismo (religioso e amoroso) e a sátira de Gregório de Matos Guerra.

5. Arcadismo em poemas líricos de Gonzaga e Bocage.

6. Romantismo

6.1. Leitura dos poemas “Navio Negreiro”, de Castro Alves, e “I-Juca-Pirama”, de Gonçalves

Dias;

6.2. Leitura do romance “A pata da gazela”, de José de Alencar;

6.3. Leitura do romance “A queda dum anjo”, de Camilo Castelo Branco.

7. Realismo, Naturalismo e Parnasianismo

7.1. Leitura do romance de Esaú e Jacó, de Machado de Assis;

7.2. Leitura do romance O primo Basílio, de Eça de Queiroz;

7.3. Leitura dos contos “Desilusão” e “Que bom marido”, do volume Contos Paraenses, de

Marques de Carvalho;

7.4. Leitura das crônicas “Trabalho feminino”, “Antônio Conselheiro”, “Prostituição infantil” e

“Recenseamento”, de Olavo Bilac.

8. Simbolismo

8.1. Leitura de poemas de Camilo Pessanha e Cruz e Sousa.

9. Modernismo

9.1. Leitura dos poemas de Fernando Pessoa (heterônimo: Alberto Caeiro);

9.2. Leitura de Libertinagem, de Manuel Bandeira;

9.3. Leitura do conto “O carro dos milagres”, de Benedicto Monteiro;

9.4. Leitura de Macunaíma, de Mário de Andrade;

9.5. Leitura de Primeira manhã, de Dalcídio Jurandir;

9.6. Leitura do romance A viagem do elefante, de José Saramago;

9.7. Leitura da peça O rei da vela, de Oswald de Andrade.

sexta-feira, 15 de abril de 2011

Uepa divulga calendário do PRISE e do PROSEL 2012

Os Processos Seletivos 2012 da Universidade do Estado do Pará (Uepa) foram iniciados nesta sexta-feira (15) com a divulgação do calendário do Processo Seletivo (Prosel) e do Programa de Ingresso Seriado (Prise).

O Exame Habilitatório para os Cursos de Licenciatura e Bacharelado em Música estão marcados para os dias 30 e 31 de outubro. Já a primeira e a segunda fases acontecerão nos dias 27 e 28 de novembro, respectivamente, e a terceira e última no dia 18 de dezembro de 2011. O período previsto para as inscrições nos Processos Seletivos vai de 1º de setembro a 06 de outubro.

O calendário foi divulgado durante a "XV Reunião Técnica do Prise", realizada no auditório do Centro de Ciências Sociais e Educação (CCSE), no Campus I da Uepa. O encontro contou com a presença de diretores e coordenadores pedagógicos de escolas públicas e privadas.

Estatísticas - Além de divulgar o calendário do próximo vestibular, a Pró-Reitoria de Graduação da Uepa divulgou as notas da primeira e segunda etapas do Prise, realizado no final do ano passado, e as estatísticas desses resultados.

De acordo com a Diretoria de Acesso e Avaliação, História foi a disciplina que teve maior média de acerto, com 58,64% na primeira fase do Prosel e 52,24% do Prise. Já na segunda fase, Francês obteve a maior média, com 60% de acertos no Prosel e 57,51% no Prise.

Nos dois processos seletivos, a disciplina Física foi a que obteve menor número de acertos, com 25,58% e 25,81% na primeira e segunda fases do Prosel, respectivamente, e 21,04% e 26,58% no Prise, Subprogramas XIV e XIII. As notas estão disponíveis no site da Uepa (www.uepa.br).

"Após o resultado dos Processos Seletivos 2011, a Diretoria de Acesso e Avaliação contabiliza os dados e hoje a Uepa os apresenta à sociedade, e chama os coordenadores pedagógicos e professores para, a partir dos resultados, contribuir com o novo processo seletivo", afirmou o pró-reitor de Graduação, Ruy Guilherme Castro de Almeida.

Isenções - Durante a reunião técnica também foi anunciado o período de solicitação de isenção para os Processos Seletivos 2012, que prosseguem até 8 de maio, também pelo site da Universidade. No período de 09 a 20 de maio, os candidatos terão de entregar os documentos comprobatórios, de acordo com o edital. O resultado das isenções deverá ser divulgado em 19 de agosto.

Este ano a Uepa oferta 11.500 isenções, um aumento de 15% em relação ao Processo Seletivo 2011. Destas, 8.050 são do Prosel, sendo 4.600 integrais e 3.450 parciais. As 3.450 restantes ofertadas pelo Prise estão divididas em igual número, entre integrais e parciais.

A Diretoria de Acesso e Avaliação informa que os candidatos agraciados com as isenções devem confirmá-las no ato da inscrição nos Processos Seletivos. "A Uepa intensifica a inclusão social e espera que os alunos se apropriem dessa política pública. Pedimos que os estudantes fiquem atentos aos prazos, se dediquem e disciplinem o tempo para conseguir uma vaga", afirmou o pró-reitor de Graduação, Ruy Almeida.

Ascom/Uepa

quarta-feira, 13 de abril de 2011

Manifesto das Famílias do Assentamento 17 de Abril a Sociedade Paraense e ao Povo Brasileiro - Eldorado do Carajás, Pará



Daqui, da Comunidade 17 de Abril, hoje somos quase seis mil pessoas numa das maiores agrovilas de assentamentos de Reforma Agrária do país; nossa residência política, ética, moral e cultural, nos manifestamos। Pelos nossos mortos e pelos sobreviventes nos manifestamos. Pela reforma agrária, pelo fim do latifúndio e sua força jurídica nos manifestamos e exigimos justiça.

Até que cesse a gana dos impunes, não se pode perdoar o carrasco, um só deles. Estamos intranqüilos, como quer o momento de vigília.

Logo, em 17 de abril de 2.011, aniversaria o massacre de Eldorado do Carajás. 15 anos! E não cabe outra definição, senão que impunidade e, Pedro Tierra o mais solidário dos poetas, ressuscitou uma palavra vil da garganta dos dicionários e a pôs nos lábios dos séculos para descrever o golpe: “atroz” Eldorado do Carajás, símbolo vigente do caráter antipopular, anti-social e antidemocrático dos que monopolizam o poder e, por ele se opõem violentamente aos que lhes contestam, por terra, dignidade, trabalho, alegria e direitos, onde tudo é negado.

O massacre é um sinal, aos pusilânimes do poder é um fardo de agonia, que jamais poderão desmentir, nem mensurar nas fibras do passado. A memória é subversiva, ninguém a modela, insurge contra os truques midiáticos e os opõe a cada ano, nesta data da classe trabalhadora e das novas gerações nascidas na luta e na resistência do povo brasileiro e amazônida frente a máquina voraz do capital.

Da marcha interrompida pela morte, onde pretendíamos chegar a Belém do Pará para uma negociação por terra, andando a pé quase oitocentos kilômetros, que para os governantes algo injustificável, como o ato insólito e traiçoeiro dos mesmos e, de todos os envolvidos. Chegamos ao mundo em notícias, em páginas de jornais e imagens televisivas numa curva onde hoje está o monumento das castanheiras e o nosso coração, um bosque simbólico.

Sabemos, uma poderosa voz nacional e internacional de denúncia e exigência ergueu-se soberana. Por isso, tudo o que somos hoje, cada fragmento das conquistas políticas, culturais e econômicas no Assentamento têm esse traço indelével, de solidariedade afetiva, religiosa e mística de milhares de estudantes, artistas, professores, intelectuais, e da grande massa do povo que, desde o primeiro instante não nos pediram conciliação dos interesses inconciliáveis, mas luta e organização. Intransigência dos pobres contra a intolerância dos ricos!

Já não somos mais os mesmos, estamos nos reabilitando com o passar dos dias da grande dor e, nessa construção que já perdura 15 anos fizemos muitos progressos na organização social das famílias, no apoderamento político e cultural, na produção de alimentos, na educação, na infância e na juventude. Há uma escola que teima ser para a vida e não para o mercado, uma mobilização pela eliminação do analfabetismo e a construção de uma pedagogia transformadora.

Não abdicamos um só momento da luta e da memória, da construção da comunidade autônoma aos interesses imperiais. Estamos sim, muito longe da vida miserável que levávamos quando vagávamos nômades pelas ruas da fronteira, massa sobrante de um modelo de desenvolvimento predatório. Hoje portamos uma identidade camponesa e desenvolvemos formas de existir mais avançadas e democráticas.

Nesses anos aprendemos que os nossos direitos só a luta faz valer e reconhecemos que temos muitos limites, agruras impostas por uma política caduca, negligente, e cheia de camaradilhas, lusco-fusco da repressão, hoje até mais sofisticada que outrora, em perseguição sistemática às organizações, às suas pautas, aos seus militantes e dirigentes e que nos impediu de fazermos mais onde não havia nada, senão cercas, escravidão e violência do latifúndio.

O que vale a pena dizer, é que inauguramos seguramente um processo novo, cujo sentido é sermos sempre melhores naquilo que fazemos, uma comunidade ligada a toda uma trajetória de luta e que aspira futuro, um novo modelo de desenvolvimento para o campo, na defesa de uma agricultura diversificada, sadia e barata à população.

Faremos esforços grandiosos para ir mudando, o que ainda não pode ser mudado, sendo com toda força e beleza, exemplo pedagógico à sociedade e aos pobres que perecem nas cidades embrutecidas pela lógica abismal de que cada um é aquilo que consome, e que sabemos não tem mais nada a perder, pois já perderam por demais na vida, que a luta é o único encontro possível que possa livrá-los da barbárie e do aniquilamento social!

Nesse momento queríamos saudá-los com essa epígrafe, de um dos melhores amigos que o Assentamento e nossa Organização teve e, que nos deixou no ano passado, o escritor José Saramago. E com esse sentimento exigir e reivindicar, o que nos cabe nessa quadra histórica: dignidade. É o nosso gesto de aliança permanente, com os ambientalistas, com os partidos políticos, com a intelectualidade, com os indígenas, com os quilombolas com as organizações urbanas e rurais, com o movimento estudantil, com os operários, com as organizações latino americanas e via campesina internacional enfim, com os que lutam e sonham e fazem superações!

Levantado do Chão!

“Do chão sabemos que se levantam as searas e as árvores,

levantam se os animais que correm os campos ou voam por cima deles,

levantam-se os homens e as suas esperanças. Também

do chão pode levantar-se um livro, como uma espiga de trigo

ou uma flor brava. Ou uma ave. Ou uma bandeira.

Enfim, cá estou outra vez a sonhar. Como os homens

a quem me dirijo.”

José Saramago

Da nossa residência, pelos nossos mortos, pelos sobreviventes e pela nossa luta, nos manifestamos e exigimos:

1. Exigimos Reforma Agrária; uma política que confronte o latifúndio e desenvolva o campo sobre outro signo, que não é o do agronegócio; hoje traduzido, em agrotóxico, comida envenenada, transgenia, reconcentração de terras e uso intensivo da biodiversidade para fins privados. O atual programa de regularização fundiária na Amazônia (terra legal) legitima o latifúndio, não se traduz em maior numero de áreas destinadas a Reforma Agrária e nem resolve os conflitos sociais.

2. Exigimos um programa imediato para assentar as quase cem mil famílias acampadas no país, em especial as famílias acampadas no Pará, nas áreas emblemáticas do Grupo Santa Bárbara, Mutran´s, Quagliatos e Josué Bengston e Fazenda São Luis, onde a VALE é o principal empecilho. Assim como a destinação das áreas públicas que tiveram seus títulos cancelados, pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para um amplo programa de Reforma Agrária no Estado, como forma de cessarem os conflitos e também de reparação pública.

3. Exigimos uma política agrícola que esteja associada ao bioma amazônico, que respeite o campesinato amazônico e sua complexidade, para que sejam guardiões da água, da terra, da floresta, dos ecossistemas e da biodiversidade. E possam exercer soberania sobre suas riquezas. Por exemplo, parar por completo, pois, não há justificativas, a não ser do interesse do capital, a construção da hidrelétrica de Belo Monte!

4. Exigimos um plano de reestruturação do INCRA nacional e das suas superintendências na Amazônia, em especial no Pará. Pesa saber, onde se estruturam os mais graves conflitos agrários no País, o INCRA seja o órgão mais desestruturado e desarticulado com a sua missão, cindindo entre os mais diversos interesses. Exigimos um plano imediato de recuperação dos assentamentos com programas sociais e infra-estrutura, em especial o Assentamento 17 de abril.

5. Exigimos justiça; reparação política e econômica às famílias dos mortos do Massacre de Eldorado do Carajás. Assim como um plano de julgamento por parte do Tribunal de Justiça do Estado (TJE) para os casos emblemáticos, que esperam julgamentos mandantes e assassinos de Trabalhadores Sem Terra, indígenas e militantes sindicais e religiosos. O fim dos despejos no campo e nas cidades!

6. Exigimos um novo modelo de desenvolvimento econômico e social para as regiões e para o Estado. Uma alternativa aos mega-investimentos e ao monopólio do projeto mineral da Vale, que devoram os ecossistemas e biodiversidades das regiões e produz desigualdade e barbárie social nas cidades, desterritorialização das famílias e grupos sociais, e tem como marca indissociável uma política de compensação social mais atrasada do mundo!

Com ternura,

Assentamento 17 de Abril,

Eldorado do Carajás

Abril, de 2.011

Ano de luta e resistência na Amazônia!

Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, MST/PA

Reforma agrária: Por justiça Social e Soberania Popular!